Sento em cima da bancada da cozinha e o observo
fazer o almoço, esse é um dos poucos momentos em que vejo esse cara desastrado
ficar mesmo concentrado. Assobiando e jogando sorrisos pra mim, eu só o olho com
cara de sapeca desejando ele e ao mesmo tempo duvidando que nada sairá errado
com a comida. Parece que ele também está feliz por estarmos ali. O
apartamento dele parece estar mais escuro hoje, mas os castanhos olhos dele
estão mais iluminados. Parece mesmo que, dessa vez, nada sairá errado. Nem com
a comida, nem com a gente. Porque eu posso me ver junto desse homem, juntando
histórias, trapos e retratos com ele. Ele me desperta sentimentos terrivelmente
inocentes, tipo o amor. Ele me envolve num romance e eu sinto que não morrerei
no final e que o nosso para sempre pode acabar, mas depois a gente recomeça de
novo. Não faço declarações para ele, mas
ambos sabemos que todas as declarações estão entre a gente.
E da forma mais livre que nós podemos ser, nós nos
prendemos, um no outro, sem querer sair. É estranho, mas é real. E parece que
não vai se dissipar como a fumaça que sai da panela onde ele está preparando a
comida.
Cantando Everything
– e imitando da pior e mais fofa forma o Michael Bublé – ele se aproxima e
eu me sinto dançar quando ele começa a cantar ao pé do meu ouvido. Me envolvo com o cheiro dele e com o cheiro
que sai da panela, mas o dele com certeza é o melhor. Ele tem cheiro de inverno acolhedor. Me
acolhendo. Me aquecendo.
- Você vai deixar a comida queimar – Digo sorrindo e
mordendo o lábio. Ele faz que não com a cabeça e me beija. E Então, o mundo é
inteirinho nosso e eu mergulho em amor. Mergulho numa formidável alma, a alma
dele. O sabor dele é de doce sem frescuras, aqueles doces simples que a gente
nunca deixa de gostar. Ele tem sabor de brigadeiro, eu acho.
- A comida tá queimando – exclamei, me soltando dele
após notar o cheiro de queimado, ainda meio abobada depois de ficar por vários
minutos envolvida naqueles braços.
- Tudo bem, eu
te amo. A gente pode pedir uma pizza. – Diz ele, colocando na frase três
palavras envolventes e declaradoras. Sem saber se sorrio ou finjo não notar o
que ele disse eu continuo olhando pros olhos dele, depois pra boca e assim
sucessivamente, buscando simples palavras. Daqui a pouco a casa pode pegar fogo
e ainda não nos soltamos.
- É, acho que a gente
pode pedir uma pizza. Eu também te amo. – Esquecemos que a maioria das
pizzarias não entregam na hora do almoço. Tudo bem, a gente se ama.